Ajuda
Até há uns anos atrás, o Chinês Mandarim estava coberto por uma aura de mistério. Era considerado um idioma exótico e indiscutivelmente difícil de aprender. Tanto estrangeiros como os próprios chineses consideravam que dominar o Chinês Mandarim era, sem dúvida, uma meta impossível de alcançar. Até que apareceu Dashan.
Neste pequeno documentário, é mostrado como Dashan deixa o público em estado de choque ao falar um Chinês perfeito num programa de TV, visto por quinhentos milhões de pessoas. Por conseguinte, Dashan tornou-se uma celebridade instantânea na China.
Muito mudou desde 1988, e o número de estudantes estrangeiros a dominar a língua Chinesa, e a viver na China, aumentou dramaticamente nos últimos 20 anos. Tornou-se comum cruzar-se com um "wairen"(estrangeiro) na China Continental. Ainda assim, muitos estudantes continuam a ter problemas quando se trata de falar Chinês. E isso deve-se a um aspeto muitas vezes considerado "dramático", de uma perspectiva Ocidental: as entoações chinesas.
Quando se fala da entoações, imediatamente passam pela cabeça duas coisas:
1) Porque é que as entoações chinesas são consideradas difíceis?
2) Há alguma maneira adequada de aprendê-las?
Falemos do primeiro problema. É importante enfatizar, mais uma vez, o seguinte:
O Chinês é um idioma de entoações. Isto não só quer dizer que as entoações formam as palavras, mas também que o próprio significado das palavras depende delas.
Em idiomas não entoados, tal como o Italiano ou o Inglês, as entoações existem. Apenas não nos apercebemos disso porque o significado das palavras não depende delas. Portanto, em teoria, as mesmas entoações podem ser usadas visualmente para representar silabas que formam as palavras em idiomas não entoados.
A primeira coisa com que te vais confrontar, quando se trata e falar Chinês Mandarim, são as entoações. Os seguintes gráficos mostram detalhadamente as quatro "alturas" de uma sílaba em Chinês.
Agora, imagina que queres aprender Italiano, e que o teu professor obriga-te a fazer a abordagem "de baixo para cima" acima mencionada. Então, deve-se começar pela qualidade sonora das sílabas e passar-se às palavras e às frases. Após aborrecidas explicações e gráficos, imagina-te a praticar as seguintes frases:
Ma che hai fatto oggi? ==> Mā chē hā-ī fàt-to ŏg-gí?
Ma dove sei andatto? ==> Mā dō-vē sē- ī ā-ndàtó?
Imagina o enorme esforço que seria tentar pronunciar uma frase procurando a entoação de cada sílaba. A coisa piora quando se pensa numa frase, na qual é necessário memorizar cada uma das entoações.
La pōlĕntá* è un cibo tipico dell’Italia del Nord. (Polenta é um prato típico do norte da Itália.)
Mi piace la pōlènta. (Eu gosto de Polenta.)
Como podes ver, a palavra "polenta" no início da palavra tem uma entoação e no final tem outra. É óbvio que esta abordagem para aprender Italiano seria desastrosa. Felizmente, ninguém ousaria adotar tal abordagem. Porém, mesmo considerando a grande diferença entro o Italiano e o Chinês, está é, de facto, a única abordagem adotada pela esmagadora maioria dos cursos de Chinês, quer seja na universidade ou em escolas privadas. E agora, há alguma alternativa para isto tudo?
Muito frequentemente, a combinação das entoações chinesas com os caracteres faz com que muitos estudantes desistam. Porém, mais de um bilhão e meio de chineses, juntamente com o vasto número de estudantes estrangeiros, falam um Chinês impecável. Isto mostra que as entoações não são impossíveis de aprender.
Muitas vezes, temos a tendência a considerar as crianças os melhores e mais rápidos aprendizes de idiomas, e justificar o seu sucesso com uma plasticidade e flexibilidade cerebral que nós, adultos, já não possuímos. Podemos fazer confusão com a definição de "plasticidade cerebral", mas o ponto chave no processo de aprendizagem é frequentemente omitido: a maneira com que eles adquirem um idioma estrangeiro é diferente da nossa.
As crianças ouvem frases completas, não começam pelas sílabas. Eles, simplesmente, ouvem pedaços de uma linguagem e identificam os componentes sozinhos. Como adultos, temos a tendência a pensar que podemos perceber a estrutura de uma língua analisando cada um dos seus aspetos, e perdemos de vista o conjunto em si. Como adultos, ainda temos a capacidade de ouvir, mas perdemos parcialmente a capacidade de escutar.
De modo a restaurar esta capacidade, é preciso paciência e um pouco de mente aberta.
Só alguns meses depois de começar a aprender Chinês da maneira "tradicional", é que me apercebi do quão importante era ouvir as frases inteiras. Este pensamento brotou em mim quando, pela primeira vez, utilizei um software especial onde um falante nativo pronunciava uma frase e eu tinha que repeti-la. Depois, o software comparava ambas as frases e dava-me uma nota de 1(muito fraco) a 7(perfeito).
Ainda que fosse uma máquina e tivesse as suas falhas, o exercício era divertido e interativo. E, sem que me sequer apercebesse, tinha tentado mais que 300 frases. Eu estava a repetir frases sem mesmo pensar nas entoações.
Com base na minha experiência, sugiro que se sigam estes passos simples:
1) Ler a introdução às entoações: é sempre útil saber que o Chinês é um idioma de entoações, e que há cinco entoações (4 + um tom neutro). Isto será sempre uma boa referência. Além disso, na etapa inicial, é preciso aprender imediatamente como pronunciar as consoantes, tendo sempre em conta a diferença entre consoantes retroflexivas (tal como zh, ch, shi) e consoantes normais (z, j, s), e entre consoantes aspiradas (p, t) e não aspiradas (b, d).
2) Assim que tenhas percebido a fonética chinesa de um modo geral, começa com frases bastante simples. Escuta-as dezenas de vezes e repete-as de olhos fechados.
3) Depois, considera as palavras individuais e tenta focar-te nelas quando estão incorporadas na frase. Caso seja necessário, anota uma lista de palavras, desde que as aprendas.
4) Passa a frases mais complexas (oração principal + oração relativa/condicional, etc...)
Além das entoações, é importante destacar que o Chinês tem uma melodia (a maneira como a frase flui) que deve ser levada em conta. Há um vídeo no Youtube bastante interessante sobre este assunto, feito pelo meu amigo Marco.
1)Por fim, depois de ter aprendido a ouvir, tens de simplesmente.... começar a ouvir! Fá-lo, pelo menos, meia hora por dia, de preferência uma hora. E, quando estejas pronto, tenta fazê-lo por ainda mais tempo. É crucial para falar Chinês como um nativo. Começa pelo audio e pela legenda correspondente.
Qualidade no começo seguida de quantidade numa fase mais avançada é uma ótima maneira de alcançar uma pronúncia excelente!
As entoações do Chinês Mandarim são, sem sombra de dúvida, um desafio. Mas podem ser aprendidas com uma abordagem apropriada. A que eu proponho é simples: considerar uma frase inteira e ouvi-la, tentar perceber os sons como um todo sem se focar nas entoações. Vais ver que esta é uma abordagem eficiente para absorver as entoações de uma maneira natural.
(*) Em 2006, Harold Goodman, autor de três audio-cursos, criou uma abordagem para memorizar as entoações através de cores. Além das cores, cada entoação vem acompanhada de um gesto. Por exemplo, para o som ā o teu polegar aponta para o lado. Para o som á, o indicador aponta para cima. O indicador e o médio formam um V para indicar a terceira entoação (ǎ), e por aí fora. Esta abordagem foi testada em estudantes voluntários nos Estados Unidos e, pelos vistos, retiveram as entoações muito bem.
Para mais informação, visite:
- http://www.michelthomas.com/learn-mandarin-chinese.php
- MANDARIN_CHINESE.pdf
Escrito por Luca Lampariello
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